domingo, 13 de julho de 2014

CAPÍTULO 08 – PRESENTE PASSADO (O DESPEDIR DE UMA VIDA MUNDANA)

Como na música Presente Passado de Isabella Taviani havia descaminhos nos passos de Linda, como se uma sombra a quisesse abraçá-la. 

 O DESPEDIR DE UMA VIDA MUNDANA   

NO APARTAMENTO    

A sensação de solidão acentuou-se quando Linda entrou no apartamento e aos poucos foi vivenciando a mesma experiência desagradável, que outrora derrotara o seu eu. 

 O sentimento de vazio que dele aflorou e que a fizera dias atrás deixar o apartamento, e ir a Costão de Santinho para reencontrar a paz. Refeita resolveu voltar ao Rio, mas bastou entrar no apartamento que o vazio quis voltar a atordoá-la ao ponto de deixá-lo novamente. 

Precisava distrair sua mente e ser feliz, mesmo que fosse por alguns míseros minutos, mas a angústia tomou conta do seu eu, os seus olhos orvalharam de lágrimas pela sensação de desconforto. 

Estranhamente sentiu um impulso irresistível de viver intensamente, precisava viver o que o mundo a oferecia para preencher o vazio existencial com alguma coisa.

Naquele estado, precisou (negativamente) do sabor do álcool na boca, colocar seu nariz a posto para tudo o que vicia, seus olhos clamavam por se maravilharem com um corpo qualquer, tomou conta de sua alma, um tanto dilacerada.

Aliás, era tudo o que ela precisava sentir-se acariciada por alguém, seu sexo pulsava, desejava sentir e dar prazer, mesmo se ele fosse algo completamente casual.  

As lembranças 

Lembrou-se das noitadas de anos atrás, da luxúria vivida no Cabaré das Rosas, quando precisava esquecer-se dos problemas, trocava de roupa, pegava o violão e ia ao Cabaré, aonde cantava, conversava amenidades, ria e no final da noite saía em companhia de outra frequentadora, se entregando ao prazer (luxúria).

Certa que os descaminhos dos seus passos eram a sombra do passado (Bruna) em seu futuro, ou a sombra do presente no minuto a ser vivido, a solidão. E era verdade, há tempo mesmo estando em sua companhia sentia-se sozinha.

O tempo que se deu em Costão de Santinho descortinou-se uma realidade, que somente Linda não tinha percebido era gritante o descompasso em seus passos.

Naquela ocasião, chegara à fase da vida que é necessário confiar em si mesmo, para se livrar do vazio existencial, ou da necessidade da presença de um alguém para viver e ser feliz.  O que fez pairar uma dúvida: 
"Será que foram as contingências da vida que a fizeram transgredir e se permitir a viver sem normas e limites, das duas vezes que tinha conhecimento?" "Ou tinha se permitido, outras vezes? "

Transgressão que, aliás, vivera e se deleitara “antes” de conhecê-la. Apesar de ter nascido em uma família tradicional e da alta sociedade carioca, desde muito cedo demonstrou que não era afeita as regras, mas por amor (Bruna) passou a respeitá-las.

Certamente ao manter aquele relacionamento tão desgastado por meses ou quem sabe anos, ela boicotava-se a si própria.

Como aquela menina que queria mudar o mundo, ou se rebelado contra a sociedade em que vivia, tinha se perdido e passara a frequentar as festas “Grans Monde”. Era como se a sua vida fosse traduzida em uma letra de música, naquele momento certamente esta seria Ideologia do Cazuza.  A qual, aliás, era por Linda divinamente interpretada em seus shows.  

Com certeza Linda enfraquecida, ou vivenciando um vazio existencial desejou “Cazuzear” e sair, como saiu em busca do prazer de viver, de se aventurar, ou correr risco de viver intensamente a vida, posto na letra da música. 
"Como o amor (Bruna) a vez respeitar à hipocrisia das relações sociais? "
O que ele (o amor) de jeito nenhum conseguiu mudar foi que ela aceitasse a hierarquização como fruto da diferenciação de classes. Por ser filha única, recebera as benesses de pertencer a uma família de classe alta, mas sempre a rejeitou. 


Um espírito transgressor

Ao quatorze anos assumira a sua homossexualidade e quando os pais souberam, por ela, forçaram-na a frequentar terapias diversas até que, convencidos de que não havia outra solução, terminaram por aceitar e, com o tempo, respeitar sua identidade\opção.

Se não bastasse, desde cedo mostrou o gosto exacerbado por música, no início tendo sido até bem aceito pela família, que a época chegava a estimular que se apresentasse nas festas familiares.

Entretanto, quando eles descobriram que o fazia às escondidas em outros lugares, passaram a proibi-la, pois esperavam que, em um futuro próximo, ela assumisse os negócios da família. 

O espírito transgressor a fez traçar outros planos para si. Ele sonhava com o sucesso no show business, a exemplo de outros músicos e cantores cujas trajetórias, em muito, confundiam-se com a sua, entretanto, mas por terem pais mais novos, os apoiavam. O que não foi, diga-se de passagem, o seu caso.

Partindo da premissa de que tudo proibido é mais gostoso, por certo a proibição de seus pais fomentara a sua rebeldia, à medida que cresceu passou a fugir para se apresentar em casas noturnas. 


O Cabaré das Rosas 

Aliás, foi assim que em uma de suas fugas noturnas conheceu o Cabaré das Rosas. Com o tempo, apesar de a proibição imposta por seus pais, até mesmo pela sociedade a qual pertencia, aos poucos passou a ser frequentadora assídua, ao ponto da proprietária tratá-la como filha.

Não tendo em casa o apoio esperado, enveredou-se numa cruzada, fugia para conhecer lugares de reputação duvidosa. Para os pais, a filha preferia uma vida mundana a aceitar o estilo de vida que lhe cabia e que podiam proporcioná-la.

Assim, conheceu e frequentou, desde cedo, dois mundos: um no qual o dinheiro e o prestígio dava poder de mando, outro aonde a falta deles tornavam as pessoas reféns daqueles que os detém.

Transitando entre mundos antagônicos, conviveu com a futilidade da classe abastarda e com o esforço sobre-humano de sobrevivência das menos privilegiadas e aprendeu a lidar bem com ambas as realidades.

Por anos, fora esse o motivo de inúmeras discussões que tivera com os seus pais e o que o sentimento de vazio a fez lembrar-se de uma das que eles tinham tido:
_ Vai para aonde, menina? (Perguntou o pai)

Respondeu-o com a rebeldia de sempre:
_ Ah! Vou sair por aí, pai. (Dando um meio sorriso)

Retrucou-a com um olhar longo e profundo:
_ Uma hora dessas, filha!

Impaciente o respondeu:
_ Hum! Vou viver papai.

No afã das preocupações paternas, continuou a indagá-la:
_ Isto quer dizer o que, Linda Alvarez?

Com um sorriso aberto no rosto e respondeu-o:
_ Quer dizer, papaizinho querido, que vou para um lugar onde a realidade é nua e crua.

O pai fechou o rosto e secamente retrucou-a:
_ Ah, este lugar deve ser algum desses inferninhos que você anda frequentando (respirou fundo).

_ Hein!

Ele ainda com o mesmo semblante, olhou para a esposa ao lado e continuou a falar:
_ É o resultado da vida mundana que você está levando.

Com a mesma rebeldia, retrucou-o:
_ É pai!  Vou a um desses inferninhos, sim.

Ao ouvir isto ele bradou:
_ Eu não disse Beatriz.

Replicou-o em alto e bom som:
_ O Senhor não queira saber o quanto eu sou cuidada e protegida nestes “inferninhos”.

Paulo continuou a bradar, mas agora era com a mulher:
_ Beatriz, essa sua filha está procurando sarna para se coçar.

Beatriz o respondeu:
_ Paulo! Isso é coisa da idade, logo passa.

Linda interveio no diálogo dos pais:
_ Isto é o que você pensa mamãe (deu um meio sorriso).

A mãe não acreditando no que estava ouvindo, exclamou:
_ Hein!

Respondeu-a, fitando os seus olhos: 
_ Amo está vida, que vocês chamam de mundana, como os lugares que frequento, como as pessoas que neles vivem. 

O pai interveio começou a falar, mas a filha o interrompeu:
_ Nossa! Diz isto como se ela fosse obrigada a frequentá-los, por não ter outra opção, mas...

Questionou-o:
_ mas, o que pai...

Continuou a falar, balançando a cabeça, como fosse um sinal de que estivesse preste a explodir:
_... mas você tem de tudo, acho que nós a mimamos demais.

Questionou-o, dando um meio sorriso:
_ Será?

Respondeu-a já demonstrando o seu inconformismo, com ritmo da conversa.
_ Aliás, não lhe falta nada, exceto o juízo.

Ao ouvir isto Beatriz achou por bem terminar aquela discussão, pedindo:
_ É melhor nós pararmos por aqui, Paulo.

Ele exclamou contrariado:
_ Não!

Disse Beatriz olhando-a com ar de reprovação:
_ Quanto mais nós dizermos não a ela, pior será. Até parece que ela faz de propósito para nos agredir.

Indignada exclamou:
_ Mãe!

Interveio Paulo mandando-a ir:
_ Vá! Depois não reclame se acontecer algo, arque com as consequências.

Usando da rebeldia, deu um sorriso e disse:
_ Fui...

Às vezes variava o diálogo, mas com a mesma tônica, era assim que ela deixava o casarão, em estilo renascentista de três andares, em que morava com seus pais.

E, partia para mais uma noitada, pronta para apreciar e viver o que de bom e ruim à noite lhe oferecia, para a sua alegria e tristeza dos seus pais. Compartilhava com terceiros a liberdade, o prazer de viver sem a futilidade das classes abastadas.

Para ir aos lugares mais adversos em que frequentava e nos quais era feliz.  Entre eles, o que ela mais gostava era o Cabaré das Rosas, aonde Dona Noêmia sabendo seu estado de espírito, sempre a puxava em um canto para conversar, e permitia que ela soltasse a sua voz e exorcizasse seus demônios no palco.

Ali ela era feliz, no meio de artistas e de gente mundana que ao longo dos anos passou a frequentar o cabaré para ver a jovem cantora se apresentar.
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“AS MARGENS DO RIO QUE SÃO OS SEUS OLHOS, EU SENTEI E CHOREI”
ROMANCE 02.0002.008 - Reeditado 13/07/14
Lei de Direito Autoral nº 9610/98

Notas finais:

-> Para você meu Mar...

->  Lê e Lia meu mui obrigado por terem me incentivado no início. 

-> Obrigada Rosana por ter carinhosamente comentado o capítulo 07

                                                                                                  
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